Louquética

Incontinência verbal

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Cenas de um outro capítulo


Mas eu não posso negar que os meus queixumes serão sempre os mesmos enquanto os meus problemas também forem os mesmos. Assim é que está sendo minha volta ao trabalho, hoje, agora mesmo: viajei ao lado de um caboclo roncador - este, pelo menos, não jogou os cotovelos contra as minhas costelas -, nunca durmo mesmo na estrada, o que me faz acordar sem ter dormido; lamentei o fato de não considerar os poucos minutos de sono como "dormir", uma vez que, para mim, dormir sentado não é dormir; lamentei as oito horas de viagem e, de novo, questionei minha sanidade mental para me meter numa dessas e, por fim, conclui que gosto da atividade, em si, gosto da cidade, até; preciso do salário, claro; mas o melhor de tudo é saber que nada é eterno e que há data marcada para isso acabar.
Não encaro com desânimo nada disso, é que o corpo pede descanso, ainda mais depois que a gente se apegou a outra rotina, à das férias.
Sono, para mim, é vital!
Tem gente que gosta de coca-cola light; tem gente que gosta de cigarro; tem gente que adora whisky; tem gente que é viciada em sexo...eu gosto de dormir - dormir sem horário determinado para acordar.
Tenho uma cama maravilhosa, travesseiros que são, literalmente, dos sonhos de qualquer um: a cama, para mim, é um templo. Lá realizo as orações do corpo e fico em paz com a minha alma. Oh, como ela me faz falta aqui!
Nessas histórias dos nossos "apesar de", posso dizer que todo mundo aprende a tecer suas compensações, apesar de. Por conta disso, volto com mais gás para casa, fico mais feliz por estar em casa, encaro com prazer a tarefa de limpar tudo que é meu, vejo felicidade nos menores gestos, como ligar a TV no canal do videoclipe e saber que eu estou de volta ao meu habitat - eu, um ser urbano! eu, um ser humano!
Mas, meu raciocínio parco se perde nas aulas que ministro à tarde, travando lutas incessantes contra o sono, contra o bocejar que se impõe e contra o cansaço, me fazendo trocar o sentido do que eu quero expressar, me deixando praticamente o Cebolinha da Turma da Mônica, não por trocar R por L, mas por trocar alhos por bugalhos, conhaque de alcatrão por catraca de canhão; rifle de caçar rolinhas por bife de caçarolinhas; apostolado por lado oposto; fuzileiro naval por funileiro nasal, entre outras emboladas de raciocínio, se é que eu tenho esse negócio que se chama raciocínio...bom, o caso é que penso que penso, então.
É muito diferente perder a noite de sono por causa de algum prazer e perder uma noite de sono por causa da labuta, ainda mais levando-se em consideração que após as festas eu chego em casa e durmo - e se houver ressaca total e arrependimentos, tomo suco de cenoura com limão, o suco oficial do arrependimento.
O trabalhador intelectual é, também um trabalhador braçal: vive do corpo, precisa do corpo, gasta a garganta e os neurônios, gasta a vitalidade, perde o viço da pele em noites insones, se desgasta, se acaba em doenças específicas, tanto quanto qualquer outro trabalhador.
Quem separou o trabalho braçal da atividade intelectual, não sabia o que estava fazendo: meu braço não se move sem a ação da minha mente; minha mente não concretiza o que pensa sem a ação do corpo, logo, essa divisão só existe mesmo no campo dos conceitos, por sinal, já ultrapassados.
Por isso também, se não faço como o trabalhador braçal, que para se divertir se acaba de cerveja após o trabalho;por outro lado procuro meus subterfúgios nas festas, no cinema, nas gargalhadas com a turma, nos passeios, na praia...
E lá vou eu, transbordando sono, dar conta do meu serviço. É, seu Ed Motta: "...Pensou no seu trabalho, ficou desanimado.Se eu fosse um político a vida não seria assim..." ou ao estilo do Ultraje a rigor, eu diria: "Todo dia essa é a minha labuta, eu trabalho como um filho da p*&¨@!

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