Louquética

Incontinência verbal

domingo, 27 de março de 2011

Não é o que parece ser, versão II




Ontem, quando estávamos na boate, olhei meio espantada o abraço grudento entre duas amigas, supostamente amigas, gente que eu não conheço. Desde que se instaurou entre o meu grupo o germe da Ilha de Lésbos, ganhamos um cuidado esquisito em não levantar dúvidas sobre nossa sexualidade.
E, como sempre ocorre, homossexual odeia ser chamado de homossexual e agora acontece que a gente é “todo cuidados” para não ofender as devidas partes, sensibilíssimas, como é de se esperar, montadas na teoria de que tudo é rótulo, inclusive identificar sexualmente alguém.
Mas, andamos mesmo ressabiadas. Ora é um receio do abraço e do carinho comuns às amigas, ora é esse negócio do cuidado com a imagem, porque no nosso caso o problema é diferente. Parto do meu próprio exemplo: saio, no carnaval, em bloco de gay e zapatista (porque se eu escrever sapatão, tomo uma sapatada na cara; e se eu disser lésbica, a minha amiga vai fazer cara de nojo); sou muito independente e isso soa como se eu dissesse que sou muito macho em minhas atitudes: troco resistência de chuveiro, entendo relativamente de mecânica de carros; troco botijão de gás e transporto meu garrafão de água mineral de vinte litros, cheio, a uma distância média de 08 a 10 metros, distância entre o portão e a cozinha. Daí que tudo isso me coloca sob suspeita e essa suspeita se reforça porque dentre os meus amigos não tenho mais que dois que sejam heterossexuais.
Uma outra amiga minha que me alertou que, por contexto, é bem capaz de os homens deduzirem que eu sou do babado, por conta disso tudo.
Estou brincando, mas o caso é sério: perdemos a naturalidade do elogio à outra mulher, a naturalidade do amparo e do contato, porque realmente tememos ser confundidas. Imagine, se quem é, esconde e odeia ser reconhecido (a) como homossexual, imagine quem não é.
Mas, não gosto de afetos visguentos com mulher nenhuma – aceito e dou abraços, gosto que peguem em meu cabelo, não interpreto mal os contatos, mas odeio abraços frente a frente. Que coisa mais esquisita é a gente abraçar uma mulher e sentir aquele volume de peitos contra os nossos próprios peitos!
Continuo gostando de homem. Exclusivamente de homem. Minha sexualidade é definida, bem resolvida e imutável - quem tiver sua identidade líquida que vá colocar em outro frasco e não inclua o meu nessa parada. Tudo bem, anda faltando homem, pelo menos homens do sexo masculino.
Dos poucos que restam, os remanescente heterossexuais masculinos que andam pelo Ville Gourmet são dos extremos etários: ou velhinhos velhuscos, ou novinhos bebês.
Ainda ontem à noite, na The House, eu que sou perseguida por alguns estereótipos, tive que agüentar as brincadeiras de Tella, porque havia um adolescente me bebendo com os olhos. Eu não disse me comendo com os olhos porque o pobrezinho certamente ainda não comeu ninguém. Por isso Tella ficou pegando no meu pé, mostrando que o menino queria perder a virgindade comigo, dizendo coisas maldosas quando o pobrezinho ia até o banheiro , suscitando que eu seria inspiração para os momentos íntimos e solitários do rapaz. Vejam como o ser humano é maldoso.
Falando nessas coisas da sexualidade,de gente maldosa e etc., ainda acho bastante interessante a nossa relação com o nu:é algo que prescruta a curiosidade, a moralidade e a admiração. Todo mundo fica nu, mas interessante é a nudez do outro.
Todo mundo sonha andando nu, num momento ou outro da vida. Vive aquela vergonha do circuito imaginativo do sonho - quando crianças, andamos nus, porque nascemos nus; depois, tudo é pura vergonha.
Também dos remanescente heterossexuais masculinos, muitos são cafajestes, espécie imprópria para o consumo.
Meu primo cafajeste comprou uma camisa para ele, a caráter, quer dizer, a mau caráter, em que está escrito: Adora sopa. Se der sopa, eu como! ah, mundo maldoso S/A.

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